Depois de 9 meses sem aparecer
publicamente e perto de completar 90 anos, Fidel Castro discursa a respeito do
futuro do comunismo e fala sobre a sua própria morte
Com
um discurso com um certo tom de despedida, Fidel Castro dirigiu-se, na terça-feira,
à sessão de encerramento do VII Congresso do Partido Comunista de Cuba (PCC)
para falar do futuro do comunismo e da sua própria morte.
Depois
de há duas semanas ter feito a sua primeira saída pública em nove meses, o pai
da revolução cubana apareceu no Palácio de Conferências em Havana, ao lado do
irmão, o Presidente Raúl Castro. Foi recebido por mil delegados a gritar
“Fidel, Fidel!”, segundo a agência oficial ACN.
“Em
breve deverei completar os meus 90 anos [13 de Agosto]… Brevemente acabarei como
todos os outros”, afirmou. “A todos chega a sua vez, mas os ideais comunistas
cubanos continuarão como prova de que neste planeta, se trabalharmos com fervor
e dignidade, podemos produzir os bens materiais e culturais de que os homens
precisam e devemos lutar sem tréguas para os obter”, declarou o antigo Líder
Máximo, que em 2006 passou o cargo ao irmão, por razões de saúde. “Aos nossos
irmãos da América Latina e do mundo, devemos dizer que o povo cubano vencerá”.
Fidel Castro em sua mais recente aparição (Imagem: AP)
Segundo
a agência espanhola EFE, Castro começou por explicar a origem da
sua ideologia: “Porque me fiz socialista? Mais claramente, porque me tornei
comunista? Esta palavra expressa o conceito mais distorcido e caluniado da
história, por parte daqueles que tiveram o privilégio de explorar os pobres,
despojados desde que foram privados de todos os bens materiais que provêem do
trabalho, do talento e da energia humana”.
No
dia 7 de Abril, Fidel Castro quebrou uma longa ausência (mas não silêncio, já
que frequentemente escreve artigos e recebe personalidades e chefes de Estado
em casa) e visitou uma escola da capital para falar da generosidade do sistema
educativo cubano. “Consideramos um privilégio estar nesta escola hoje, porque
este tipo de escola aproxima-se de um tipo de sonho”, afirmou.
No
regime de partido único não se esperam mudanças. O PCC anunciou que Raúl
Castro, com 84 anos, e José Ramón Machado Ventura, de 85, continuarão a liderar
o partido durante pelo menos uma parte do novo mandato de cinco anos. O novo
congresso só acontecerá em 2021.
Esta
reeleição indica que apesar das alterações radicais nas relações entre Cuba e
os Estados Unidos, e da tentativa de mudanças econômicas, os líderes da geração
Castro não têm pressa em abrir caminho a sangue novo, escreve o New
York Times. “Isto é um golpe para os cubanos mais novos que estão desejosos
de ver um sistema mais pluralista, liderado por pessoas mais próximas das suas
idades e sem as ortodoxias socialistas”. No seu discurso, Raúl Castro excluiu
qualquer renovação e avisou que um sistema multipartidário “seria o princípio
do fim”.
A íntegra do discurso:
“É um esforço sobre-humano dirigir qualquer povo em
tempos de crise. Sem eles[os dirigentes], as mudanças seriam impossíveis. Em
uma reunião como esta, aos mais de mil representantes escolhidos pelo próprio
povo revolucionário, que a eles delegou sua autoridade, significa a maior honra
que receberam na vida, e a isso se soma o privilégio de ser revolucionário que
é o resultado de nossa própria consciência.
Por que eu me tornei um socialista, de forma mais
clara, por que eu me tornei um comunista? Essa palavra que expressa o conceito
mais distorcido e caluniado da história por aqueles que tiveram o privilégio de
explorar os pobres, despossuídos uma vez que eles foram privados de todos os
bens materiais que proporcionam o trabalho, talento e energia humana. Desde
quando o homem vive neste dilema, ao longo do tempo, sem limite. Eu sei que
vocês não precisam dessa explicação, mas talvez alguns dos ouvintes.
Falo simplesmente para que se compreenda melhor que
não sou ignorante, extremista, ou cego, ou que não adquirida a minha ideologia
por conta própria estudando economia.
Eu não tive preceptor, quando era um estudante de
direito e ciência política, naquelas em que eles tem um grande peso. Desde que
tinha ao redor de 20 anos, gostava de esportes e de escalar montanhas. Sem
preceptor para me ajudar no estudo do marxismo-leninismo; não era mais do que
um teórico e, é claro, tinha total confiança na União Soviética. A obra de
Lenin seria ultrajada após 70 anos de revolução. Que aula de história! Podemos
dizer que não devem transcorrer outros 70 anos para que ocorra outro evento como
a Revolução Russa, para que a humanidade tenha outro exemplo de uma grande
Revolução Social, [como a] que significou um grande passo na luta contra o
colonialismo e seu ajudante, o imperialismo .
Talvez, no entanto, o maior perigo agora pairando
sobre a terra deriva do poder destrutivo das armas modernas que poderia minar a
paz no mundo e tornar impossível a vida humana na superfície terrestre.
As espécies desapareceriam como os dinossauros
desapareceram, talvez não haveria tempo para novas formas de vida inteligente
ou talvez o calor do sol cresça até fundir todos os planetas do sistema solar e
seus satélites, como muitos cientistas reconhecem. Se certas, as teorias de
vários deles, que não são leigos ignorantes, o homem prático deve aprender mais
e se adaptar à realidade. Se a espécie sobrevive a um espaço de tempo muito
maior, as gerações futuras saberão muito mais do que nós, mas primeiro terão
que resolver um grande problema: Como alimentar os milhares de milhões de seres
humanos cujas realidades inevitavelmente colidem com os limites para a água e
os recursos naturais que necessitam?
Alguns ou talvez muitos de vocês se perguntem onde
está a política neste discurso. Acreditem, eu tenho vergonha de dizer isso, mas
a política está aqui nestas palavras moderadas. Esperemos que muitos humanos se
preocupem com essas realidades e não continuem como nos dias de Adão e Eva a
comer maçãs proibidas. Quem vai alimentar as pessoas famintas da África sem a
tecnologia na ponta dos dedos, sem chuva, sem barragens, sem depósitos
subterrâneos cobertos por areias? Veremos o que dizem que os governos que quase
em sua totalidade subscreveram os compromissos climáticos.
Devemos martelar constantemente sobre estas questões e
eu não quero me extender além do essencial.
Devo, em breve, cumprir 90 anos, eu nunca teria
pensado em tal ideia e isso nunca foi o resultado de um esforço, foi capricho
da sorte. Logo serei, já como todos os demais. A todos nós chegará nossa vez,
mas ficaram as idéias dos comunistas cubanos como prova de que neste planeta,
se você trabalha com fervor e dignidade, é possível produzir os bens materiais
e culturais que os seres humanos necessitam, e nós devemos lutar
incansavelmente para obtê-los. Para nossos irmãos da América Latina e do mundo,
devemos transmitir que o povo cubano vencerá.
Talvez seja a última vez fale nesta sala. Eu votei em
todos os candidatos apresentados para consulta pelo Congresso e agradeço ao
convite e a honra de que me escutem. Felicito a todos, e, em primeiro lugar, ao
companheiro Raul Castro por seu magnífico esforço.
Empreenderemos a marcha e aperfeiçoaremos o que
devemos melhorar, com a máxima lealdade e força unida, como Martí, Maceo e
Gómez em marcha imparável.
Fidel Castro Ruz”
Fonte: Pragmatismo Político